Mykonos-33

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   Durante vinte minutos os dois falaram intermitentemente, Joninho estava resoluto, queria voltar para a caverna dos pais e se propunha a trabalhar para alimentar a filha e a esposa, a qual não queria mais se relacionar. Laura queria continuar casada, pois desejava ardentemente ser a esposa do futuro líder – apesar de manter em segredo este desejo – mas para isso o marido tinha que mudar, tratá-la com mais carinho e atenção. Jonas ouvia todas as colocações sem ainda saber como iria resolver o impasse. Quando os dois terminaram de falar, um silêncio profundo tomou conta do escritório improvisado. O líder fechou os olhos e pediu uma luz ao Grande Pai, apesar de já estar inclinado a ceder a vontade de Joninho. Neste momento, uma voz vinda do âmago de seu cérebro lhe disse:
   – Dê mais responsabilidade a seu filho, ele precisa se sentir mais útil.
   Jonas abriu os olhos e sem ao menos raciocinar direito cometeu o maior erro de sua vida. Disse:
   – Joninho e Laurinha, se vocês não brigarem nenhuma vez durante os três próximos meses e a paz voltar a reinar entre as famílias como antes… Eu darei a você, meu filho, a liderança da Comunidade. Não interferirei mais em nenhuma de suas decisões, mas isto só prosseguirá se não houver mais discussões e vocês me derem muitos netos.
   Não falou absolutamente nada sobre o tipo de liderança que seu filho poderia exercer, isto deu margem a todas as atrocidades que estavam por vir. Jonas selou o futuro da Comunidade com esta decisão, a partir do dia que seu filho mais velho se viu livre para agir como bem entendesse, todos começaram a sofrer as consequências das atitudes de um homem desiquilibrado e cruel. A voz que Jonas ouviu era de seu irmão Alberto, mas não houve tempo para concluir o que ele queria transmitir, ou seja, dar mais responsabilidade ao filho, mas jamais se afastar do papel de ser aquele que dá a última palavra em todas as decisões importantes.
   Não será necessário dizer que o casal passou a se comportar exemplarmente, que Laurinha conversou com sua família e exigiu que todos tratassem a família de seu marido com toda a deferência, sem agressões, nem xingamentos. Os dois mantinham as aparências em público, mas no íntimo o ódio silencioso corroía o espírito de ambos. Só se relacionavam sexualmente porque Joninho disse que tinham que cumprir o que o pai lhe determinou: lhe dar outros netos. Laurinha teve que ceder, pois para ela, crianças eram um trabalho inútil, sempre que podia delegava os cuidados com Piedade à Raquel, ou mesmo a Maila, que também se sentia responsável por colaborar na criação da neta.
   Após os três meses estipulados por Jonas e sem ocorrer nenhum contratempo na vida do casal e dos familiares envolvidos. A palavra empenhada teve que ser cumprida. No dia que Jonas se dirigiu ao filho dizendo:
   – Filho, a partir de hoje você é o novo líder da Comunidade! Tenha muita paciência e busque sempre o bem de todos.
   Aconteceu uma catarse entre os membros do grupo, ninguém acreditava que Jonas realmente passaria a liderança da Comunidade para aquele rapaz ríspido e sem nenhum preparo para lidar com os problemas que com certeza viriam. Os três irmãos de Jonas se colocaram terminantemente contra a decisão, a ponto de ameaçaram se mudarem para Semiris. Mas Jonas permanecia irredutível, disse que prosseguiria trabalhando como sempre, mas nunca mais interferiria em nenhuma atitude do filho.
   A noite que antecedeu o dia marcado para a transferência do poder foi muito movimentada, o burburinho tomou conta de todas as cavernas, todos queriam evitar que Jonas proferisse a frase acima, mas de nada adiantou.
   Joninho felicíssimo respondeu ao pai:
   – Fique tranquilo papai, esta Comunidade terá o líder mais trabalhador e justo que o senhor poderia escolher.
   Nas primeiras semanas, tudo prosseguiu como antes, Joninho manteve uma postura sensata, a ponto de Jonas acreditar que tinha tomado a decisão correta, mas isto durou pouco. As brigas com Laurinha retornaram ao dia a dia da Comunidade, mas desta vez, mais brandas que as anteriores. Eram agressões verbais diante das crianças e familiares, que provocavam um ambiente carregado, muito longe da paz e tranquilidade de dias passados.
   Após três meses como líder, Joninho convocou todos os moradores da Grande Pedra para uma reunião importantíssima, como ele mesmo qualificou, queria divulgar as novas normas de conduta de todo o grupo. Jonas ficou muito preocupado pois sabia que não poderia contestar nenhuma decisão do filho, sob risco de pôr a perder todo o esforço de anos longe do país natal. Se colocar contra qualquer determinação seria o mesmo de jogar sua palavra no lixo e isto ele jamais o faria. Até mesmo Maila pediu para que o marido retrocedesse, mas como todos os outros que tentaram, não conseguiu demovê-lo da decisão.
   Na manhã do domingo marcado pelo líder, Joninho apareceu bem vestido, com um sorriso nos lábios, acompanhado de Laura e Piedade que começava a engatinhar. Sentou-se em um banco que no passado era usado por Jonas, toda vez que falava com todos ao mesmo tempo. O banco ficava sobre uma plataforma de pedras e podia ser visto por toda a assistência. Nenhum irmão de Jonas compareceu. Rubens, Atilio e Josias prosseguiam sendo terminantemente contra a decisão do irmão mais velho.
   Joninho pediu que todos fizessem silêncio, e começou a falar:
   – Amigos, a partir de hoje uma nova era se inicia para toda a Comunidade da Grande Pedra, gostaria que os presentes se incumbissem de colocar os ausentes cientes do que vou comunicar, pois caso não haja concordância convido a se mudarem para outro lugar.
   Neste momento, Maila que estava ao lado do silencioso Jonas, se levantou abruptamente e disse:
   – Joninho, você não pode fazer isso, eu sei que está se referindo aos seus tios. Não admito que você expulse qualquer um deles daqui.
   O rapaz olhou para a mãe respondeu de pronto:
   – Cale-se mãe, não é só papai que não pode contestar minhas decisões. Você também não pode, ou melhor, nenhum morador da Grande Pedra pode ir contra ao que eu decidir.
   Maila abaixou a cabeça e sentou-se lentamente, sem dizer mais nenhuma palavra.
   – Bem, agora que já deixei tudo claro, vamos as novas regras da Comunidade.
   – Em primeiro lugar, cada morador deverá cuidar de sua caverna com mais cuidados de higiene, é proibido defecar, acumular lixo ou roupa suja. Eu mesmo, passarei em revista semanalmente.
   Muitos aplaudiram esta nova regra, pois a muito, um cheiro insuportável invadia todas as cavernas, principalmente no verão. Alguns moradores por preguiça de defecar fora das cavernas, acabaram por transformá-las em banheiro público, que na época ainda não existia.
   – Em segundo lugar, todas as mulheres deverão cuidar não só da caverna de sua própria família, mas também se revezarem para limpar as plataformas de pedra que servem de área comum. Vejo que hoje a sujeira e a falta de higiene impera nestes locais.
   Outra medida que agradou a grande maioria, Jonas nunca se incomodou muito por estabelecer regras de limpeza e higiene, pois para ele isto era irrelevante. Mas sabidamente, muitas crianças estavam morrendo na primeira infância por infecções contraídas devido o relapso com os cuidados básicos.
   – Em terceiro e último lugar, todos os meninos maiores de seis anos irão trabalhar na plantação a partir de amanhã.
   Ao dizer isto, se levantou e se retirou, sem esperar qualquer tipo de concordância.

continuação…

 

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