Mykonos-9

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    – E então papai, perguntou Jonas filho. Encontrou alguma coisa?
    -Sim, meu filho. Caminhando em direção ao mar, próximo ao último campo que delimitamos, encontrei sim, uma cabana abandonada, com muitos apetrechos de pesca, mas nenhuma ferramenta, a não ser esta foice.
    Erguendo um monte de capim seco, mostrou uma grande foice, sem cabo, parecendo nunca ter sido utilizada. Quem falou agora foi Atílio.
    – Apetrechos de pesca para nós é de nenhuma utilidade pois não somos pescadores, mas a foice sim, com ela poderemos capinar as ervas daninham que teimam em invadir a plantação.
    Jonas se aprumando, prosseguiu, tentando explicar o que temia.
    – Não é bem assim Atílio, nós não somos pescadores ainda, mas poderemos ser caso seja necessário. Eu temo que Mario não venha, pois o caminho é muito difícil e a bússola que ele tem em suas mãos está quebrada. Neste momento, ouve-se um burburinho e Josias falou novamente:
    – Que história de bússola é essa, nós não sabíamos que ele tinha uma e muito menos quebrada.
    Jonas pediu a palavra novamente, tentando concluir o que havia começado, agora iria até o fim.
    – Nos dias que Antônio ficou se recuperando, eu tentei encontrar algum morador da Vila Cantar que falasse o italiano e pudesse dar maiores informações sobre nosso novo sócio. Dr. Alecsander me disse que havia um nativo da ilha que havia trabalhado em sua casa em Nápoles durante muitos anos e poderia me ajudar. Hipólito me disse que Mario estava em Mykonos  a três meses e neste período havia saído duas vezes para procurar os campos férteis, mas sempre caminhava pouco e voltava dizendo que nada tinha encontrado. Um dia, ele pediu que o nativo o auxiliasse a buscar algumas sementes que chegaram de Creta e ainda estavam na embarcação, ancorada no cais onde desembarcamos.
    Era visível a inquietação de todos os ouvintes, ninguém ousava interromper a narrativa, pois sabiam que o relato de Jonas escondia o futuro de todos eles, mesmo as crianças menores estavam quietas e também prestavam atenção; apenas o pequeno Vicente de dez meses, filho de Josias e Nair, em alguns momentos ameaçava chorar. Os outros meninos falavam… psiu… deixe o Tio Jonas falar, em seguida ele aquietava. Jonas olhava a todos e a impressão era de que não enxergava ninguém, tal a sua concentração. Prosseguiu.
    – Hipólito e Mario combinaram sair no final da tarde, assim não sofreriam com o sol escaldante e quando chegassem lá, no início da noite, poderiam dormir e retornar no dia seguinte bem cedo com a carga. E assim fizeram, quando na manhã seguinte já estavam iniciando a caminhada de volta, Mario disse que teria que voltar à embarcação, pois havia esquecido sua bússola e sem ela não era ninguém. O nativo sentou-se em uma pedra para aguardar seu retorno. Por acaso, viu o bornal de Mario no chão ao lado dos sacos de sementes  e um brilho intenso lhe chamou a atenção. Quando verificou com mais atenção, viu a bússola emaranhada em uma infinidade de fios que Mario usava para marcar o caminho quando não havia sementes. Hipólito pegou a bússola pensando em ir atrás de seu companheiro para dizer que a havia encontrado, mas ele já ia longe e com certeza não ouviria seus gritos. Sentou-se novamente com o aparelho nas mãos. Intuitivamente olhou para o mar, ele sabia que ali era o norte, mas quando olhou para a bússola, esta apontava para noroeste.
    – Ele percebeu que estava quebrada, pensou em avisar Mario, mas quando este voltou esbaforido e viu que ela estava nas mãos de Hipólito, ficou possesso. Disse que ele poderia ir atrás dele se não fosse um preguiçoso que preferia ficar sentado em vez de poupá-lo de procurar em toda embarcação. Ficou aborrecido em todo o caminho de volta e quando chegaram na Vila Cantar disse que não ia lhe pagar um tostão, pois se não fosse ele, teriam chegado mais cedo e poderia utilizar seu tempo para procurar os campos férteis.
    – Sendo assim, Hipólito ficou calado e concluiu que ele não encontrava as terras porque ia na direção errada, pois com certeza, o aventureiro trazia informações corretas passadas pelos nativos que se desgarraram no mar e foram parar em Creta, pois se não fosse assim não teria investido tanto dinheiro em sementes e equipamentos.
    – Irmão, mas porque este nativo te contou tudo isso? Perguntou Josias curioso.
    – Ele me disse que não achava justo Mario se aproveitar de nossa situação para receber sem trabalhar, mesmo se dizendo sócio investidor; os equipamentos e as sementes não justificavam um ganho tão elevado. E disse mais, se Mario se recusasse a partir conosco, jamais ele nos encontraria, usando aquela bússola quebrada. Finalizando a conversa, Hipólito me aconselhou a pensar no assunto, caso eu decidisse contar ao nosso sócio, ele confirmaria que foi ele que me falou, caso contrário, o assunto morreria ali.
    – Papai, você fez muito bem em não dizer nada. Interferiu Jonas filho.
    Jonas com olhar de reprovação, completou:
    – Filho, eu pensei longamente no assunto durante vários dias e decidi que quem iria resolver esta situação era o próprio Mario.
    – Como assim? Perguntou Maila.
    – Na manhã de nossa partida, todos viram eu perguntar inúmeras vezes se ele não iria conosco. Caso a resposta fosse sim, durante a caminhada eu pediria para verificar a bússola e diria que ela apontava o lado contrário que teríamos que ir, pois eu já conhecia o caminho, assim Mario descobriria sozinho que ela estava quebrada. Jonas prosseguiu:
    – Como a resposta sempre foi não, eu calei-me, pois se o Grande Deus achar que ele é merecedor, encontrará o caminho, com ou sem bússola.
    Todos prosseguiram em silencio, mesmo terminada a narrativa, parecia que queriam entender o que isto significava. O motivo da reunião era que eles estavam exaustos e pensavam em parar até a chegada dos equipamentos trazidos por Mario, e com esta notícia, com certeza seria muito difícil obterem esta ajuda tão bem-vinda.
    Atílio foi o primeiro a se restabelecer e dizer:
    – Estamos em uma situação complicadíssima, você deveria ter nos dito o que descobriu, para ponderarmos se viríamos ou não.
    Jonas não esperava aquela colocação, afinal, sempre quis o bem de todos e não tinham outra alternativa a não ser partir, com ou sem Mario. A vida estruturada havia ficado para trás, agora todos deveriam começar do zero, se quisessem realmente prosseguir vivendo. Jonas respirou profundamente e disse:
    – Vou fazer de conta que não ouvi o que você disse meu irmão. Eu confio na nossa força de trabalho, unidos venceremos todos os obstáculos que se apresentarem, se não pudermos plantar, seremos pescadores; varas, anzóis, redes e até um velho barco, eu encontrei na cabana abandonada. Amanhã, levantamos bem cedo e vamos procurar sinais se os nativos que se desgarraram no mar deixaram para trás alguma coisa que nos pode ser útil.
    Com este jorro de esperança, todos ficaram de pé e aplaudiram Jonas demoradamente, este olhando para o alto agradecia a Messias que nos últimos dias aparecia constantemente em seus sonhos, dizendo que estavam no caminho certo, que nada os impediria de vencer nesta nova terra, a não ser a falta de esperança. Quando os aplausos cessaram, Jonas tomou a palavra dizendo:
    – Então vamos aguardar a chegada de Mario, caso este venha realmente, prosseguiremos a honrar nosso acordo, vinte por cento de tudo que for produzido será dele. Por outro lado, se ele não conseguir chegar até aqui devido àquela bússola quebrada, com certeza, não morreremos de fome, comeremos peixe, raízes, frutos, até que o Grande Deus nos dê um caminho a seguir.

continuação…

 

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