Sem saída, só restou a Laercio pedir que sua filha se mantivesse à parte e não pensasse mais nisso, no fundo, ele tinha certeza que forças invisíveis eram as responsáveis pela dura realidade de separatividade e infindáveis conflitos, e não queria nem pensar no assunto, com medo de se envolver também, mas Rute não se deu por satisfeita, fez a seguinte colocação:
– Eu já estou com mais de trinta anos e não acho correto viver o resto da minha vida em um lugar onde até as amizades que podemos ter são determinadas por outras pessoas, acho que só poderemos ser realmente felizes se pudermos sorrir para todos, conversar com quem quisermos, visitar os amigos, por isso, daqui para frente, tentarei sempre seguir o que eu acho correto.
Sem tempo para que Laercio respondesse, os dois ouviram um barulho de passos de pessoas se aproximando, olharam para trás e se depararam com Percilio que retornava de Lagos em companhia de Hipólito. Após os cumprimentos usuais, o líder da Comunidade fez menção em prosseguir seu trajeto, quando Laercio se encheu de coragem e sem perceber no teor das palavras que saiam de seus lábios, disse:
– Percilio, eu sei que está cansado, mas eu preciso muito conversar com você e gostaria que Rute também participasse.
Um mal estar pairou no ar, foi Hipólito que rapidamente interferiu dizendo:
– Minhas pernas doem, preciso de um bom banho e muito descanso, sigo meu caminho, vocês fiquem à vontade para conversar.
Sem dizer mais nada, se colocou a caminho da Grande Pedra.
Tomado de surpresa, Percílio respondeu:
– É claro Laercio, sou todo ouvidos.
Colocou seu bornal em cima de uma pedra, sentou-se ao lado de Rute, aguardando as colocações de Laercio. Este, pigarreou um pouco e após um longo silêncio, disse:
– Hoje pela manhã, Luizinha me pediu que acompanhasse sua filha Sibila até o riacho. Ela tropeçou no último degrau da escada que dá acesso a plataforma onde fica minha caverna e derrubou os baldes de água que trazia. Eu a acompanhei, pois ela é ainda muito menina para carregar um peso destes.
Percilio ouvia atento o relato, ao mesmo que tempo que uma voz feminina soprava em seus ouvidos a seguinte frase:
– Aproveite a oportunidade de trazer a paz para a nossa Comunidade!
Sem mover um musculo e já acostumado com estas interferências que sempre creditou ao auxílio do Grande Deus que enviava seus colaboradores para ajudá-lo nos momentos de dificuldade. Ele conseguia ouvir, tanto a voz, como Laercio que prosseguia, tendo Rute como ouvinte atenta.
– Durante a caminhada, Sibila me disse que o Grande Deus era quem conduzia todos os acontecimentos, e que foi ele que pediu para você cuidar dela, muito antes de morarem na Grande Pedra. Me desculpe se estou tocando neste assunto, acredito, que esta afirmação de sua jovem filha, foi para mim, como que uma enxurrada de água a muito represada.
Podia-se ouvir as batidas do coração de Laercio, tanta era emoção que ele colocava em suas palavras.
– Mas papai, você pode explicar melhor! Eu não estou entendendo o que o Senhor está querendo dizer!
Percilio permanecia calado, prestando atenção em todos os movimentos ao seu redor. O fato de Rute ter interferido no diálogo, sem nenhuma inibição, denotava que o encontro se direcionava ao objetivo que as entidades angélicas que o intuíam estavam buscando: Conseguir quebrar a passividade que a dezenas de anos acompanhava Laercio. Este, mesmo não se envolvendo em polêmicas orquestradas por entidades vis, também não se abria para receber os eflúvios de amor emitidos por sua mãe e energias sutis de outras esferas.
Quando Rute decidiu mudar-se para a caverna da avó, algo indicava que a luta travada no invisível estava sendo decidida a favor das entidades da Luz. A convivência com Pilar alterou sua vibração para muito mais sutil, a vontade de sua prima de unir todos os membros da Comunidade, fortalecida pela necessidade de sonhar, um dia poder casar-se com Silas, o neto de Alberto, fazia com que a cada nova conversa das duas amigas, desejando a paz e a união entre as famílias, atraísse inúmeros espíritos desencarnados que possuíam energia similar as duas e também tinham recebido do Grande Deus a tarefa de cuidar, direcionar e unir os membros da Comunidade da Grande Pedra.
Esta vida, diferente da vida em Constantinopla, a família Silva se expôs a muitas interferências externas. Alguns membros do grupo vinham de uma linhagem espiritual diversa ao da família de Aimanon, por isso, tantos conflitos. Por outro lado, foi a vida em Mykonos que permitiu selar o pacto de amor que perdura até hoje – no Século XXI. Os espíritos que tiveram o privilégio de reencarnar neste núcleo de médiuns e aproveitaram a oportunidade concedida pelo Grande Deus de evoluir pelo amor, trazem no seu cerne, a necessidade premente de colaborar neste momento tão especial que vive a Humanidade, onde o joio será separado do trigo e um Novo Planeta Terra surgirá em todo seu esplendor. Entre eles, Mirtes, Laurinha e Luizinha. As três, vivem hoje, momentos distintos, mas permeados de acontecimentos, que fazem com que elas elevem o pensamento e agradeçam o privilégio de poderem aproveitar a oportunidade de auxiliar o irmão desalentado. E foi, neste final de domingo, muitos anos antes do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo, que muitos espíritos em desalinho foram resgatados, graças ao singelo esforço de duas primas – Rute e Pilar, ao desejarem sinceramente a paz e a união.
Laercio ergueu os olhos, olhou para sua filha, e como se Percilio não estivesse presente, pronunciou as seguintes palavras:
– Filha, tudo que nos rodeia é obra de um Grande Deus que não permite que nenhum de nós fique sem respostas aos nossos questionamentos, por isso, não se preocupe, você será realmente feliz, sorrirá para todos e receberá outros sorrisos em retribuição.
Percilio foi finalmente intuído a interferir, tudo que seria dito e pactuado daqui para frente, representaria um marco na vida da sofrida Comunidade, que apesar de poder contar com dinheiro suficiente para se manter dentro dos limites de um certo conforto, não possuía o bem mais importante: A Luz do Amor e da Conciliação!
continuação….