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Um dia, sozinho na casa do rio, perguntei a Uruãn qual era o motivo desta postura de Armanide e ele me respondeu em tom de reprimenda:
– Aimanon, mas ela já te disse! Teve vários sonhos nos quais ela cuidava de Suzana e de seus irmãos, como ela poderá fazer isso se estiver morando na Grécia?
Fiquei desconcertado, me senti uma criança de dois anos querendo saber por que o sol se põe, mas mesmo assim, não poderia encerrar o assunto aceitando essa explicação tão descabida.
– Uruãn, Armanide estava tão feliz e certa que amava Luca, não há como aceitar que simples sonhos tenham a feito retroceder desta maneira.
– Aimanon, ela não retrocedeu, apenas prossegue seu caminho. Simples como uma gota de orvalho!
Grande Deus, o que acontece comigo? Não há como compreender com tanta simplicidade. Nada do que aconteceu é para mim – simples como uma gota de orvalho – afirmei para Uruãn.
– Meu amigo, até parece que você desconhece as leis que regem a sinergia entre os médiuns e o Grande Deus, quando soube que traria ao mundo doze crianças, você logo procurou uma esposa, pois sem ela, não poderia cumprir o que lhe foi pedido, o mesmo ocorre com Armanide agora, ela tem uma tarefa que deverá ser cumprida nesta terra, então é obvio que não poderá ir morar em outro lugar.
A lógica de Uruan, não era a minha lógica, estávamos falando de Armanide, a menina fruto do meu amor por Suzana, que mexia profundamente com tudo que aprendi nesta curta trajetória como suposto médium. Passada a surpresa inicial, me convenci que o melhor para sua vida era realmente o casamento com Luca, pois teria alcançado a meta de toda mulher, ter uma família própria e um marido destemido e trabalhador. Não poderia deixar que Uruãn partisse sem me explicar melhor esta história.
– Uruãn – ousei perguntar – você não acha que decidir o futuro desta maneira, baseado em sonhos fortuitos, não é algo que a consciência decide sem o amparo da razão?
Ocorreu um silencio mortal – senti vontade de retirar a pergunta – mas já estava feita, só me restava aguardar a resposta, que veio após um interminável istmo de tempo.
– Muito me espanta tal pergunta, vinda de alguém que se diz tão preparado para conduzir consciências em absoluto desalinho com as leis da natureza. Quantas vezes você repetiu a irmãos anônimos que sonhar é ouvir os ensinamentos do Grande Deus e ter o privilégio de receber noticias daqueles que um dia amamos e partiram, e mais, que também ficamos sabendo através dos sonhos o que o futuro reserva para nossas vidas?
Engoli em seco, mas ainda não me sentia satisfeito, nem convencido, credito os sonhos de Armanide ao receio de ir morar tão longe de nós, apenas isso. Prossegui com valentia, pois o que estava em jogo era o futuro de minha menina:
– Uruãn, desculpe minha insistência, mas não consigo imaginar Armanide morando conosco até ficar idosa, isto é algo que não gostaria para o futuro dela.
Meu amigo riu ruidosamente – me deixando ainda mais constrangido e me disse em tom de chacota:
– É claro que ela se casará e terá sua própria família, você mesmo não disse que você e Suzana só considerariam pedidos de pretendentes depois que ela completasse dezoito anos?
Pensei: – Meu Grande Deus aquele menino franzino, que mal consegue olhar nos meus olhos? Não pode ser …
Uruãn, como se lesse meus pensamentos, prosseguiu.
– Ele mesmo Aimanon, aquele menino franzino, de olhos furtivos, será seu genro.
Senti que meu amigo se fora. Deitei na esteira, olhei para o teto e senti como se o tempo houvesse parado. Não era possível o que acabara de ouvir, possivelmente, se isto realmente fosse verdade, teria que trabalhar mais, para sustentar minha filha e seu marido. Mas estava totalmente equivocado.
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continuação…