Mykonos-5

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    Ana contou que ela e Rafael queriam muito conceber um filho, mas por algum motivo, que só o Grande Deus conhecia, até agora, após quase cinco anos de vida em comum, não haviam recebido este presente tão desejado.
    Maila, pensando sobre o que lhe havia confidenciado a amiga de infância, respondeu:
    – Ana, eu e Jonas, nos casamos a sete anos e por enquanto só temos dois filhos, apesar de nós sempre desejarmos uma família numerosa. As forças desconhecidas é que regem estes acontecimentos, assim como regem a seca e a chuva.
    Atenta, Otélia, a prima mais querida e também a mais ponderada, completou:
    – Amigas, acredito que as crianças chegam quando estivermos prontos, nem antes, nem depois. E a quantidade, não é nosso desejo que determina mais sim o quanto o Grande Deus confia na nossa capacidade de recebê-las e conduzi-las através das vicissitudes da vida.
    As duas amigas confusas com a colocação tentavam entender o que Otélia tinha acabado de dizer. Quem primeiro se aprumou foi Maila, dizendo:
    – Prima, então você quer dizer que o seu Grande Deus acha que eu e Jonas não temos capacidade de conduzir outras crianças em direção a enfrentar as dificuldades que com certeza se depararão?
    – Não é bem assim, respondeu Otélia, tentando se concentrar para explicar melhor, continuou:
    – Eu só quis dizer que tudo tem sua hora e em se tratando do acolhimento de novos filhos o Grande Deus só permite quando há um motivo oculto.
    Maila e Ana se entreolharam curiosas, pois Maila era politeísta, acreditava em vários Deuses, mas Ana, não. Ela, assim como Rafael, acreditava no Deus único e aguardavam a vinda do Messias. De qualquer maneira, independente da crença de cada uma, a colocação – motivo oculto – levantou muita curiosidade.
    Ana se levantou, olhou firmemente para Otélia e falou:
    – Então quer dizer que o Grande Deus não nos deu um filho ainda porque falta um motivo oculto?
    – Não, Ana, é porque ainda não chegou a hora, ou melhor, o filho de vocês ainda não está pronto para vir.
    Aliviada, a esposa de Rafael, respondeu:
    – Então ele virá?
    – Creio que sim. Dependerá apenas do merecimento de vocês em vidas passadas.
    Neste ponto da conversa, Mirla e Tereza se aconchegaram no colo das mães e interromperam a conversa dizendo que estavam com fome.
    Desde o décimo dia após a partida a comida estava sendo racionada, os adultos recebiam apenas uma refeição por dia que consistia de frutas secas e pão, as crianças eram alimentadas com mais regularidade, mas mesmo assim em horários pré-determinados e ainda não havia chegado a hora da porção do meio-dia. As duas mães começaram a niná-las para ver se adormeciam e enganavam o estômago até o horário combinado. Ana assistia a cena com lágrimas nos olhos, pensando intimamente:
    – Grande Deus, eu não sei o que eu e Rafael fizemos em outras vidas para não merecermos a dádiva de ter um filho, mas seja o que for, por favor, nos perdoe.
    Naquela época, enquanto a Igreja Católica ainda não tinha sido consolidada, os Cristãos, já formavam uma grande parcela da população do Continente Europeu.  Nosso Senhor Jesus Cristo ainda não havia nascido, mas médiuns de todos os países, tanto Ocidentais como Orientais já sabiam que ele viria. Os ensinamentos que o filho de Deus propagaria no futuro, já se faziam presentes na vida daqueles que por força da falta de embasamento lógico abandonavam o politeísmo. A reencarnação era aceita naturalmente, pois trazia muitas explicações que coincidiam com questionamentos frequentes, como a causa de tantas diferenças entre as castas. Á partir da morte de Jesus é que foi incorporado aos ensinamentos Cristãos que a reencarnação era algo impossível de acontecer e aqueles que prosseguiam acreditando começaram a ser perseguidos pela Igreja Católica Apostólica Romana e foram proibidos de se auto denominarem Cristãos.
    No caso das três amigas,  apenas Maila era politeísta por força daquilo que aprendeu com seus pais já falecidos. Ana e Otélia, tinham uma visão bem diferente, acreditavam no Grande Deus mais temiam que tivessem muitos débitos acumulados em vidas passadas. Com o passar do tempo, tanto Jonas como Maila, passaram a dar mais ouvidos aos preceitos do Deus único.
    As duas meninas adormeceram rapidamente, aqueles dias de privações deixavam debilitado o corpo de todos. As crianças, sem espaço para brincar, com água cobrindo seus pés, eram obrigadas a permanecer a maior parte do tempo sobre os bancos. Elas dormiam muito e quando acordavam mal tinham ânimo para se levantar. E assim a rotina prosseguia espartana por quase três semanas, quando ao amanhecer do vigésimo dia de viagem, Jonas filho começou a gritar:
    – Olhem lá, chegamos à Grécia!
    Apontando para a linha do horizonte onde se vislumbrava algo parecendo uma grande cobra escura coroando a água do mar.
    O capitão Mirko, ainda sonolento, apanhou sua rústica luneta, com a qual poderia enxergar com mais proximidade o ponto que Jonas filho apontava, examinou com muito cuidado. Todos aguardavam em silêncio, temendo que fosse apenas alguma outra embarcação. Mas assim que terminou de olhar a linha do horizonte, disse:
    – É mesmo a Grécia! Chegamos!
    Foi uma festa só, todos se abraçavam e solidários rezavam para que a nova vida oferecesse muitas oportunidades de seguirem a vida com dignidade.
    Rapidamente, grandes formações rochosas se aproximavam, muito diferente da costa italiana, onde, mesmo do mar se vislumbrava grandes extensões de terra. Ninguém imaginava que não teriam campos para plantar mais a realidade parecia contrária ao que esperavam. Assim que a embarcação aportou em uma praia deserta, Jonas pediu a palavra:
    – Amigos, não vamos nos precipitar. Sempre soube que a Grécia era formada por diversas ilhas de formação rochosa, mais isto não quer dizer que não poderemos plantar para alimentar nossa família.
    Alberto, após ouvir as palavras do irmão, pronunciou irritado:
    – Se você sabia, porque nunca nos disse nada?
    – Porque vocês desistiriam de partir e seriam mortos pelos bárbaros!
    Após esta troca de palavras ásperas, Josias comunicou a todos que também sabia o que os aguardava. A inquietação aumentava.
    Novamente Jonas intercedeu:
    – Será que vocês não entendem que se não tivermos terras para arar seremos pescadores, com tanto mar, ninguém morrerá de fome.
    E assim, os ânimos se acalmaram e todos começaram a preparar-se para o desembarque. Como não havia deque para facilitar a evacuação dos passageiros, todos teriam que se utilizar de um pequeno bote que comportava apenas quatro pessoas por vez. Apenas no início da noite todos já se encontravam pisando as rochas da Ilha de Mykonos.

continuação…

 

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