Constantinopla-46

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    Quando mamãe soube que Armanide se casaria no Templo, exultou de felicidade, creditou o fato a condescendência minha e de Suzana em enxergar o politeísmo com outros olhos, mas o que ocorreu é que Artur e Claudia ofereceram-se para preparar a festa de casamento, e após isto, conversando com Armanide e Adolfo – Artur esclareceu:
    – Minha querida Armanide, se você e Adolfo preferirem pediremos ao seu pai que conduza a cerimônia de casamento na Casa do Templo, e a seguir comemoramos.
    Armanide perguntou intrigada:
    – Tio, eu já o ouvi se referindo ao Grande Deus, me explique então porque você é Sacerdote de um Templo onde as pessoas que o frequentam acreditam de uma maneira tão diferente?
    Tenho certeza que esta era uma dúvida de todos, inclusive minha e de Suzana, algumas vezes já havíamos conversado sobre isso sem chegar a conclusão alguma.
    – Armanide – começou pacientemente Artur – a grande dificuldade reside no crer sem ver. É por isso que o Grande Deus sempre permitiu que os homens usassem alguns objetos como motivo de adoração e conexão com  seu Universo, quando eles creditam ao poder de um símbolo concreto, acontecimentos, que na verdade foram conduzidos pelo Grande Deus passam a ter mais fé e orar com mais muramento.
    Tudo que é creditado a cada um destes Deuses, na verdade é obra de um só : Deus nosso Pai, mesmo porque, foi ele que tudo criou e tudo comanda, desde a força dos ventos até o desabrochar de uma rosa.  Então não é incorreto imaginar que uma pedra foi responsável pelo sol que fez crescer o milho, pois esta pedra é comandada pela inteligência do Grande Deus.
    Armanide e Adolfo ouviram com atenção e foi meu genro o primeiro a se manifestar:
    – Artur – disse ele reticente – desde que eu nasci nunca aprendi nada com meu pai além da necessidade de trabalhar para comer.  Agora, com este pouco tempo de convívio com esta família, entrei em contato com algo que jamais pensei existir, este Deus, que ama e direciona seus filhos.  Eu sei agora, que ele sempre esteve ao meu lado sem que eu me desse conta, por isso gostaria apenas que ele abençoasse minha união com Armanide, independente do lugar e através de quem nós receberemos esta benção.
    Armanide decidida argumentou:
    – Então Tio, gostaria que você realizasse a cerimônia no Templo Sagrado!
    E assim ficou combinado. Artur respondeu com um indescritível carinho:
    – Filhos, tenham certeza que esta união à muito já foi abençoada pelo Grande Deus.
    E neste momento, aquela construção branca, imponente, perante as humildes habitações vizinhas, saltava diante de meus olhos e não me contive, ajoelhei ali mesmo e orei em agradecimento.  Germano, Túlio e Ruan também oraram comigo.
    Quando nos levantamos, vejo várias pessoas correndo em nossa direção, eram Germano – o jardineiro – sua esposa Clélia e seus sete filhos, todos vestidos com suas melhores roupas, era uma outra família, distinta e feliz.  Ele me abraçou e disse:
    – Senhor, não poderia deixar de vir ao casamento da menina Armanide e de meu sobrinho Adolfo, acho que desconhece o fato de eu ser irmão de seu pai.
    Realmente não sabia.  Agradeci os cumprimentos e a presença.  Caminhamos todos juntos até nos postarmos diante do Jardim do Templo.  Ele estava maravilhoso, não se via nenhuma erva daninha, as rosas vermelhas separadas das rosas brancas, as margaridas contornando cada canteiro, tudo harmonicamente arranjado, percebi claramente as mãos de Claudia na escolha das flores e nos locais dos canteiros.  Não pude deixar de dizer:
    – Que espetáculo divino!  Parabéns Germano!
    Ele se inflou de orgulho.
    – Senhor, desde que foi à minha casa, isto a sete anos, nunca mais bebi, nunca mais ralhei com meus filhos nem com minha esposa, acho que as flores me trouxeram serenidade e paciência.
    – O menino Nuno e a menina Armanide foram os responsáveis por todas as bênçãos que minha família recebeu, não deixo de orar um dia sequer pela felicidade dos dois – afirmou Clélia comovida.
    Eu e meus filhos ficamos tocados com este acontecimento.
    Um movimento ao nosso lado e vejo inúmeras pessoas se aproximando: Tia Adelaide e seus filhos, Tia Mirna e família, Tia Adelane, Tia Ágata, enfim todos os meus queridos familiares.  Adentramos no Templo, estava todo adornado com lisianthus azuis e no pequeno Altar – madressilvas, as flores preferidas de vovó.
    Adolfo estava no lado esquerdo do Altar acompanhado de seu pai Cinelius, cumprimentei-os com um pequeno aceno, mas meus olhos buscavam Suzana.  Laila me vendo ao longe, correu em minha direção, me abraçou e falou que Suzana estava na Casa do Templo com Tica e Claudia terminando de arrumar Armanide.
    Me tranquilizei, sentei-me no fundo do salão, vi Rafael orientando Adolfo e seu pai, vi mamãe, Antron, Rômulo, Lisias, Ana e Caio, enfim, toda a família já tinha chegado.  Só não vi Tia Croele.  Seu marido e seus filhos estavam lá.
    Pensei com muita tristeza:
    – Como pode alguém guardar tanto rancor por algo tão insignificante?  Minélus, com certeza, já passava para outro estágio de crescimento, e ela prosseguia inflexível se achando injustiçada e traída.
    Perdido em meus pensamentos não vi primo Rafael se aproximar.  Me assustei quando me abraçou e disse:
    – Aimanon, vá até a casa de Claudia se despedir de sua filha, e volte com Suzana, para esperá-la no Altar ao lado de Adolfo e seu pai.
    Inicialmente não entendi, perguntei para Rafael porque precisaria me despedir de Armanide?
    Ele riu sonoramente, todos se voltaram em nossa direção, senti que corei.
    – Aimanon – me disse com seu usual tom cerimonioso – amanhã Armanide já não vai mais morar com você e Suzana, é neste sentido que disse que deveria se despedir.
    Levantei-me apressadamente, me sentindo um parvo, com a impressão que todos no Templo riam da minha ignorância.
    Laila me acompanhou até onde Suzana e Armanide se encontravam.  Ao transpor a porta do quarto onde ela se arrumava, pensei que ia desfalecer.  Estava linda, toda vestida de branco, com uma mantilha rendada sobre os ombros, os cabelos cacheados adornados com incontáveis sempre vivas arranjadas em forma de uma coroa delicadíssima que mais parecia um nimbo de luz.  Nas mãos um buquê de lisianthus azuis, as mesmas flores que adornavam o Templo, só que salpicadas de minúsculas margaridas do campo.  Uma visão inesquecível.  Nunca mais, em incontáveis existências, vi uma noiva tão bela, superando até minha querida Suzana.
    Eu, paralisado, olhando fixamente para minha filha, vejo Uruãn ao seu lado me saudando, percebi que queria falar comigo:
    – Amigo, encerra-se aqui sua missão, prepare-se para a próxima viagem.
    Eu, parecendo ter incorporado o maior parvo da face da terra, pensei:
    – Claro, agora a missão de cuidar dela é do menino adoentado, que graças ao Grande Deus me parece capaz de cumprir com seus deveres.
    Neste momento, não me detive em meditar ao que ele tentava dizer quando se referiu à fazer uma viagem.
    Tudo isto ocorreu em uma fração de segundos, nós três: eu, Suzana e Armanide nos abraçamos emocionados, minha filha falou com os olhos marejados.
    – Papai, Mamãe – preciso lhes dizer que vocês dois são os melhores pais que alguém poderia desejar!
    Laila, com seu costumeiro jeito tímido, completou:
    – Também acho o mesmo!
    Beijei as duas, me dirigi ao Templo com Suzana, pois Rafael já nos solicitava.  Deixamos que as tias e Laila a acompanhassem.  Nos postamos do lado direito do Altar.  Artur já paramentado aguardava em um pequeno banco nos fundos do Templo.  Quando vi Claudia, Catarina e Laila entrarem, percebi que Armanide já se encontrava do lado de fora, Adolfo chorava copiosamente.
    Rafael abriu a grande porta de madeira maciça, Armanide em pé, olhava a todos com a expressão de amor e carinho que sempre fez parte de seu semblante.
    Ela entrou caminhando lentamente.  Suzana segurando minha mão me transmitia as batidas de seu coração, a emoção era tamanha que tudo desapareceu em uma fração de segundos, restando Armanide e as mãos de minha esposa.  Ao se aproximar do Altar, após receber um beijo na testa de Adolfo, a cerimônia teve início.  Artur falou, transmitindo todo seu carinho por nossa família, e enfatizando que estes eram um dos objetivos de estarmos aqui – formarmos e cuidarmos de nossa família.
    Armanide e Adolfo transmitiam felicidade intensa, parecendo emanar por todas as células. O pai de Adolfo, em nenhum momento demonstrou emoção, apenas cumpria um dever como pai.  O Templo vibrava união e alegria, minhas tias choraram muito, Tia Adelane era a mais emocionada, todo momento enxugava as lágrimas, pois amava Armanide como se fosse sua própria filha.
    Finda a cerimônia, após os cumprimentos, fomos para a Casa do Templo.  Era uma grande construção que seguia o mesmo estilo arquitetônico do Templo, do lado direito, o telhado se estendia por aproximadamente vinte metros formando um grande galpão onde eram realizados muitos eventos comemorando grandes acontecimentos.   Claudia e Catarina passaram o dia de ontem, adornando tanto o Templo quanto o galpão.  As colunas que sustentavam o telhado estavam todas ornadas com flores silvestres, uma infinidade delas, multicoloridas, contribuindo com a sensação de alegria que pairava no ar.

continuação…

 

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